sexta-feira, julho 08, 2005

















... Estava deitada na areia da praia quase deserta com um mar translúcido à minha frente,
saboreando cada uma das sílabas da palavra: en ga na da.
Caminhei até à água, que surpreendentemente não estava fria, era densa e transparente e mergulhei como se entrasse noutro mundo: treze anos de erros e de ignorância, treze anos equívocos, afundavam-se agora, devagar, rente à areia e às pedras, no olhar que seguia a sombra fugidia dos peixes e, afinal, tudo se tornava claro e evidente na luz que chegava filtrada três metros debaixo de água.

Eu sempre o soubera: sempre, sempre me procurei debaixo de água, sempre, em cada Verão, mergulhei nesta luz e neste silêncio, apalpando as rochas e as pedras, alisando a suavidade de veludo das algas, os meus olhos atentos e deslumbrados com cada coisa, o corpo habituando-se à consistência desta liquidez submersa. Sempre soube que debaixo de água me livrava de todos os males do mundo e emergia, nova e liberta, para as suas ciladas e os seus enganos.

Sentei-me depois na esplanada à beira-mar, os olhos pesados de sal e de azul, eu, um café e um cigarro, ninguém, nenhum som, nenhuma recordação, nenhuma ameaça entre mim e a perfeição deste momento.
E lembrei-me de ti, com ternura (ou seria paixão?). A palma das tuas mãos, a pele dos teus pulsos, os dedos esguios e longos, um sorriso meio tímido, meio atrevido, o teu riso, o teu humor, a tua inteligência cristalina.
Guardei-te para quando os teus olhos pousassem sobre mim, para quando a tua mão me tocasse no rosto, a tua boca limpasse os vestígios de sal da minha pele.

Esforcei-me por não me distrair. Para passar por ti como se passa por um episódio, por um acidente na estrada, por uma ilusão de água num mar infinito de areia. Só queria a solidão da solidão, o silêncio submerso dos dias vazios e sem destino, a consistência da água e a evidência das rochas. Queria um mundo sem ti, uma vida!
Tu és como a anémona que segue a corrente que passa, és a lapa presa à rocha, o sulco na areia durante a maré vazia que indica o caminho de regresso ao mar, tu és a densidade da água dentro da qual eu me reencontro e reconstruo.

Saí da esplanada, olhei ao longe o mar e a luz da eternidade. Vi areia, rochas e pedras, vi tudo o que me manteve cativa até hoje e toda a liberdade à minha frente, olhei o passado e o futuro, o Norte e o Sul, e levantei os braços para voar sobre tudo isto, mas estava presa... este Verão ainda era tua!!!

2 Comments:

Blogger Night said...

Muito bonito, vivi o momento como se esivesse lá... parabens, tens muito jeito
Beijocas*

09 julho, 2005  
Blogger Su said...

Muito bonito! Gostei muito da maneira como escreves...
****bjinhos****

11 julho, 2005  

Enviar um comentário

<< Home